'Não respeito pessoa capaz de falar o que ela falou', diz Dilma sobre Janaina
02/09/2016
Ex-presidente concedeu entrevista à imprensa estrangeira nesta sexta (2).
Advogada citou netos da petista ao justificar pedido de impeachment.
Janaína Paschoal chorou na tribuna do Senado no fim do discurso no qual disse que pediu o impeachment de Dilma pensando nos netos da petista (Foto: André Dusek/Estadão Conteúdo)
A ex-presidente Dilma Rousseffx afirmou nesta sexta-feira (2), durante entrevista a jornalistas de veículos estrangeiros, no Palácio da Alvorada, que não respeita uma pessoa capaz de falar o que a advogada Janaína Paschoal – uma das autoras de seu pedido de impeachment – falou na tribuna do Senadox sobre os netos da petista.
Na última terça (30), em meio ao debate entre defesa e acusação no julgamento final, Janaina justificou ter pedido a cassação do mandato de Dilma por pensar no futuro dos netos da agora ex-presidente.
Na ocasião, o comentário da advogada de acusação gerou indignação entre petistas.
O advogado de defesa de Dilma, José Eduardo Cardozo, chegou a dizer que era "inadmissível" alguém pedir a condenação e dizer que o faz pelos netos dessa pessoa.
Questionada nesta sexta pelos correspondentes estrangeiros sobre a fala da advogada, a petista respondeu disse que as convicções de Janaina não se parecem com as dela.
"Acho que vocês assistiram ao comportamento da doutora.
O comportamento da doutora é um comportamento de uma pessoa cujo as convicções não se parecem com as minhas nem do ponto de vista político nem do ponto de vista cultural nem do ponto de vista humano.
Não respeito uma pessoa capaz de falar o que ela falou", declarou Dilma.
"[Justificar que pediu o impeachment] para os meus netos? Eu quero um Brasil democrático, cheio de oportunidades.
E eles terão, tenho certeza, e não é por causa da doutora Janaína", complementou.
Dilma concede entrevista a jornalistas de veículos estrangeiros no Palácio da Alvorada (Foto: Reprodução / Facebook)
Dupla votação
Dilma também afirmou à imprensa internacional que achou "estranhíssima" a dupla votação no julgamento final do Senado que aprovou seu afastamento do comando do Palácio do Planalto, mas manteve sua elegibilidade.
A petista questionou, principalmente, o fato de 16 senadores terem se posicionado a favor do impeachment na primeira votação e terem rejeitado, em uma segunda consulta por voto, que ela ficasse impedida de concorrer a cargos eletivos e ocupar funções na administração pública.
Em outro trecho da entrevista, Dilma afirmou que a aprovação do seu afastamento do governo representou sua "pena de morte política" e a decisão que autorizou que ela possa vir a ocupar funções públicas "não atenua" isso.
"Eu acho que é estranhíssima essa dupla votação.
Esta é a discussão.
Vota de um jeito numa votação e depois vota de outro em outra? Em Minas, a gente ficaria desconfiado.
Nós mineiros somos muito desconfiados.
Acho que a estrada de votos é muito tortuosa", declarou a ex-presidente.
Embora tenha feito um pronunciamento à imprensa horas após a decisão do plenário, esta foi a primeira entrevista de Dilma como ex-presidente da República.
"Você tem um impeachment sem crime de responsabilidade, afasta uma pessoa inocente do cargo e, além disso, tira os direitos políticos por 8 anos também sem crime? E, aí? O que acontece? O maior contrato que existe neste país, que é entre o governo e seu povo, é rompido de todas as formas.
Não acho que [a manutenção da elegibilidade] atenua ou não atenua o que eles fizeram, não acho.
Acho oque são detalhes e decorrências do que fizeram.
Poderiam ter feito diferente.
Me condenaram à pena de morte política ao me tirar da Presidência.
Está é a maior pena que um brasileiro pode ter", declarou.
Em outro trecho da entrevista, Dilma mencionou o agora presidente da República Michel Temer e afirmou que, se ele não cumprir o programa de governo prometido por ela durante a campanha de 2014, fará um governo "ilegítimo".
"Eles começaram a executar [antes mesmo do impeachment] um programa de governo que não tem o menor respaldo das urnas.
Não foi este o programa de governo que eles estão implementando que me levou [à presidência] e levou comigo junto o vice [Temer].
Não foi este.
Se ele se dá o direito de utilizar a Vice-presidência para assumir a Presidência, tem também de usar a condição de vice para cumprir o programa que me deu o mandato nas urnas.
caso contrário a ilegitimidade é total", afirmou.
Oposição a Temer
Questionada sobre se tem "projetos políticos" para o futuro, Dilma afirmou que não tem projeto político eleitoral, mas fará "oposição" a Temer.
"Não tenho projeto político no sentido eleitoral, não tenho isso elaborado.
Tenho um projeto político no sentido de que farei oposição ao governo [Temer], independentemente de onde esteja", enfatizou.
Lula
Dilma também foi questionada pelos correspondentes estrangeiros sobre se há "mágoa" entre ela e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva porque na quarta-feira (31), quando ela fez sua primeira manifestação pública após o Senado aprovar o impeachment, ele não estava ao lado dela, mas, sim, no mezanino do Palácio da Alvorada.
Dilma negou qualquer mal-estar e disse que seu padrinho político não estava ao lado dela somente porque havia um tumulto de repórteres, fotógrafos e cinegrafistas ao redor dela.
"Vocês podem continuar insistindo, o que já fazem desde o primeiro dia que assumi, nessa conversa.
O presidente Lula não estava ao meu lado porque vocês viram o tumulto que foi, isso não tem pé nem cabeça [dizer que há mágoa entre eles]", destacou a ex-presidente.
"Não só o Lula ficou aqui comigo em todos os processos, como ele esteve presente comigo, acompanhou a votação comigo, esteve presente comigo em todas as circunstâncias.
Ele foi ao Senado [assistir ao depoimento], me encheu de apoio e carinho e, por ele, eu tenho imensa consideração, além de política, pessoal.
Sugiro que vocês desistam, é uma perda de tempo tentar me indispor com o presidente Lula", complementou.
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Mudança para Porto Alegre
Em meio à entrevista, Dilma informou que pretende se mudar para Porto Alegre após deixar o Palácio da Alvorada, mas informou que só deve deixar a residência oficial da Presidência no início da semana que vem.
No dia em que o Senado aprovou o impeachment, a assessoria da petista informou que ela sairia do Alvorada até o fim desta semana.
Dilma explicou que vai adiar um pouco a mudança porque tem que levar todos os seus pertences que estão na residência oficial.
"Isso requer um pouco de logística e suor", ressaltou.
A presidente disse ainda que há a possibilidade de ela "ficar um tempo" no Rio de Janeiro, cidade onde a mãe dela, Dilma Jane, tem um apartamento.