Corte de gastos: Lira diz que governo 'não tem votos', mas Câmara deve votar urgência dos projetos nesta quarta
04/12/2024
Presidente da Câmara diz que impasse sobre emendas gerou 'intranquilidade' na negociação política.
Governo quer aprovar pacote ainda este ano para enviar sinal ao mercado.
Presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL)
Kevin Lima/g1
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmou nesta quarta-feira (4) que a base aliada do governo Luiz Inácio Lula da Silva não tem votos suficientes na Casa, atualmente, nem para aprovar o regime de urgência para os projetos do pacote de corte de gastos.
O governo enviou os textos ao Congresso na última semana e conta com a aprovação das propostas ainda este ano para enviar uma sinalização de responsabilidade fiscal ao mercado.
Lira promete "celeridade e boa vontade" com cortes de gastos
Para isso, no entanto, será preciso aprovar o chamado "regime de urgência" – um rito acelerado para os textos, que seriam votados diretamente no plenário da Câmara sem passar pelas comissões.
🔎 Para aprová-lo, o plenário da Câmara precisa atingir a chamada maioria absoluta.
Ou seja: no mínimo, 257 votos — mesmo quórum necessário para aprovação de um projeto de lei complementar.
Os pedidos de urgência chegaram a ser incluídos na pauta de terça (3).
Mas a análise acabou adiada diante da insatisfação de parlamentares com a decisão do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), que estabeleceu novas regras para a retomada do pagamento de emendas.
Nos bastidores, deputados avaliam que a decisão de Dino — confirmada, por unanimidade, pelo plenário do STF — foi mais rígida do que a lei aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente Lula para moralizar as emendas parlamentares.
Essa postura, segundo Lira, tornou o cenário de aprovação dos projetos — e até mesmo das urgências — mais turvo.
"Hoje, o governo não tem votos sequer para aprovar as urgências dos PLs.
A PEC, eu coloquei na CCJ [Comissão de Constituição e Justiça], pedi para ser extrapauta e foi retirado — a pedido do governo —, porque acho que não tinha a certeza de ter os mínimos votos para aprovar a admissibilidade da PEC na CCJ", afirmou o deputado em evento do portal "Jota".
"[É] um momento de muita instabilidade, de muita ansiedade, de muita turbulência interna, por causa desses acontecimentos que não são inerentes ao convívio harmônico, constitucional, de limites entre os Poderes, principalmente nas suas circunscrições do que pode ou não fazer.
Você nunca vai ver um deputado julgando alguém, ou condenando alguém num tribunal, como também não deve ver nunca um juiz legislando", acrescentou.
O presidente da Câmara afirmou que, embora haja turbulências na negociação política, colocará os pedidos de tramitação acelerada em votação nesta quarta (4).
Lira disse não ter "dúvida" de que o Congresso "não vai faltar" ao seu papel de analisar, discutir e votar as propostas.
O deputado afirmou que está "trabalhando" para que os requerimentos conquistem os votos necessários.
E que as negociações para concluir a análise do pacote devem se estender pelas próximas semanas.
Na área jurídica, a Advocacia-Geral da União (AGU) já entrou em campo para tentar alinhar a decisão de Flávio Dino aos anseios do Congresso.
Em pedido protocolado na terça (3), o órgão solicitou ao ministro a reconsideração de trechos da decisão que, para Executivo e Legislativo, ultrapassam a lei sancionada por Lula para pacificar o tema.
"Temos que tratar esse assunto [corte de gastos] com seriedade, o que não está sendo fácil.
Porque tem muitas variáveis, que estão acontecendo, que não dependem só da vontade do Congresso, que não estão ajudando no encaminhamento de sensibilidade política desse momento", declarou Arthur Lira.
Flávio Dino libera pagamento de emendas parlamentares, mas faz novas exigências
Corte de gastos
As propostas enviadas pelo governo — um projeto de lei, um projeto de lei complementar e uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) — incluem ajustes orçamentários que buscam equilibrar as contas públicas, impactando áreas como aposentadorias e salário mínimo.
Com as medidas, o Planalto prevê economizar R$ 375 bilhões até 2030.
A recepção aos projetos, anunciados na última semana pela equipe de Fernando Haddad, já não havia sido satisfatória em diversos setores do Congresso — grande parte influenciada pelo anúncio de uma reforma no Imposto de Renda.
E o cenário político, que já estava agitado pelas demonstrações do mercado financeiro, ficou ainda mais bagunçado com as determinações de Dino desta semana.
O Congresso esperava que as novas regras para emendas, sancionada por Lula, fossem suficiente para que Flávio Dino liberasse o envio dos recursos indicados pelos políticos.
Não foi o que ocorreu.
Na avaliação de deputados e senadores, o ministro "ignorou" balizas definidas pela nova lei e estabeleceu inovações em relação ao texto.
Como resultado, a insatisfação atingiu, em cheio, o debate sobre as propostas de corte de gastos.
Além do adiamento da votação das urgências na sessão de terça, nesta manhã, o governo decidiu pedir a retirada de pauta, na CCJ, da PEC enviada pelo governo.
🔎 O rito de análise de PECs na Câmara estabelece a CCJ como primeiro passo.
É o órgão que dá aval — ou não — à proposta e encaminha a PEC a uma comissão especial, que discute e propõe mudanças ao texto.
Somente depois disso, a iniciativa vai ao plenário.
PEC deve ser 'apensada' a texto anterior
Arthur Lira também disse buscar uma outra saída para a PEC do Planalto.
Segundo ele, ainda hoje, a proposta poderá ser anexada a um outro texto mais avançado na Casa, o que permitirá que a PEC não passe pela CCJ nem por uma comissão especial.
"Como eu disse, a PEC enviei para a CCJ, para minimamente cumprir o rito.
Tive uma conversa com a presidente, que foi muito solícita e botou no extrapauta.
Mas logo o próprio governo pediu para retirar extrapauta.
O que deve acontecer com a PEC é que vou procurar uma que tenha compatibilidade, a exemplo do que já foi feito anteriormente, de jurisprudência da Casa, com instruções que permitam apensá-la a uma PEC pronta para plenário", disse Lira.
De acordo com ele, somente depois disso, será definido o relator da proposta, que, entre outras coisas, altera regras para o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e abono salarial.
"Essa providência [do apensamento] deverei estar tomando agora de tarde, na minha volta pra Câmara.
Mas, ainda assim, repisando aqui que nós temos que ter muito diálogo para vencer esses assuntos nas próximas duas semanas", completou.
Corte de gastos: entenda como as propostas do governo vão tramitar no Congresso até virar lei
Até o fim do ano
Apesar das "turbulências", Arthur Lira avaliou que é preciso aprovar, ainda neste ano, as medidas enviadas pelo governo federal para ajustar as contas públicas.
A expectativa é a mesma no Palácio do Planalto.
Para Lira, as regras precisam ser contempladas nas leis orçamentárias de 2025.
"As medidas, ao meu, ver precisam ser votadas nestas três semanas porque ainda temos o Orçamento [de 2025] para entregar até o final do ano, que precisa estar enquadrado nesses cortes.
Chamamos de cortes, mas é uma diminuição na velocidade do crescimento das despesas", afirmou.
Segundo o presidente da Câmara, o governo também está "empenhado" em fazer avançar as propostas.
"Vamos conseguir nessa semana, na outra, vamos dialogando.
O governo está empenhado, o próprio presidente Lula deve estar preocupado com essa situação", destacou.